sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Ninja Assassino abusa dos clichês para jorrar sangue digital

By: Marcel Plasse

Hollywood tem dois jeitos de filmar homenagens ao cinema de ação marcial japonês: com reverência e referências, à moda de “Kill Bill” (2003), ou como um “Bezão” apelativo e descerebrado, feito “Ninja Americano” (1985). Escrito em 56 horas, segundo gabou-se o roteirista J. Michael Strazynski (criador da série “Babylon 5”), “Ninja Assassino” pertence claramente à categoria mais baixa.

O filme abre com sua melhor sequência: um ataque ninjitsu que vira cena de horror gore, bem ao gosto da nova safra trash japonesa. Mas, passado o impacto sangrento, a trama engata um enredo convencional de espionagem televisiva, com direito a melodrama confinado em flashback e um vilão de voz sussurrante. A previsibilidade dos flashbacks, da salvação da mocinha, da motivação do herói, da ordem em que os personagens duelam e até do desfecho resulta na antítese de um suspense. Quem viu um filme de ninja antes – pode ser até “Elektra” (2005) – já sabe como a história termina com menos de 10 minutos de projeção.

A trama é bem simples e ainda assim completamente incongruente. Ninjas, que há mil anos são usados como assassinos por governos poderosos, sem nunca deixar testemunhas, de repente começam a aparecer em vídeos de segurança, a agir no meio da rua, acenando espadas para carros, a atacar gângsteres, políticos corruptos e até a invadir um prédio militar. É óbvio que acabam chamando a atenção da Interpol (ou Europol, numa renomeação típica de quadrinhos).

A ação se passa em Berlim, onde todos, claro, falam inglês – dos orientais aos moradores locais. E onde existe a pior segurança de aeroportos do mundo, pois só isso explica o transporte de um prisioneiro numa caixa fechada até a fortaleza ninja japonesa – que, por sinal, fica logo ali pertinho, dobrando a esquina do corte de edição. Mas o que se pode esperar de um roteiro marretado em 56 horas?

Que os irmãos Wachowski são apaixonados pela cultura pop oriental sabe-se desde “Matrix” (1999), que introduziu em Hollywood o uso do wire-fu, o kung-fu com efeitos especiais. Depois de fazer “Speed Racer” (2008), um filme-autorama baseado no anime dos anos 60, eles voltam a produzir uma obra de temática japonesa, dirigida por seu pupilo, James McTeigue (“V de Vingança”).

“Ninja Assassino” traz de volta Rain, o ator, modelo e cantor coreano com quem os irmãos trabalharam em “Speed Racer”. Uma piada no filme refere-se à carreira pop do cantor, quando os ocidentais dizem que ele parece mais integrante de “boy band” que um ninja assustador. É uma constatação verídica.

Se algo se salva do fogo crítico é a concepção expressionista dos ninjas, realizada por McTeigue. O diretor explora bem o conceito de assassinos das sombras, filmando as lutas sempre à noite e em locações escuras, mas principalmente fazendo os guerreiros de negro emergirem da escuridão, feito criaturas macabras. Seus ninjas são como monstros de filmes de horror, vindo do nada para arrancar pedaços e esguichar sangue digital no colo do espectador.

Onde o filme mais se esforça são nas coreografias de ninjitsu, que tentam até explorar a estética dos elementos. Há lutas na chuva e em meio às chamas, embora nada que remeta à plasticidade de Zhang Yimou (“Herói”, “O Clã das Adagas Voadoras”).


Suor perdido à toa. Mesmo a sequência de duelos entre o tráfego pesado de Berlim, a apoteose da ação, acaba sendo vulgarizada, pois todas as lutas, o tempo inteiro, são engolfadas em jatos de pixels encarnados, fatiadas por close-ups fora de hora e derrubadas por uma edição de computador que deixa o trash pop de “Azumi” (2003) parecendo balé clássico.

Os excessos visuais, praga da edição moderninha, comprometem o apelo “B” de “Ninja Assassino” em troca de uma aparência “descolada” de adaptação de quadrinhos. Mas no fundo ele não passa de um filme tosco, daqueles que se costumava ver em VHS, no velho videocassete dentado que há muito mastigou “Mortal Kombat” (1995) e “Ninja Americano 5” (1993).



(Pipoca Moderna 05/02/2010)

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